Newton Vieira de Souza
A serenidade do médico Newton Vieira de Souza salvou a
minha vida
Por Vanderlei Testa
A elegância e a postura amiga e simpática do médico
Newton Vieira de Souza era notada por todos nós festeiros do Divino da Catedral
Metropolitana. As fotos do meu álbum com as imagens de 1987 registram alguns
dos momentos em que o casal Vieira de Souza se dirigiu na fila para ganhar a
rosca do Divino. Padre João Santucci era o vigário. Havia na época um grupo
formado por casais que levavam as insígnias, desde o imperador aos que iam como
tocheiros abrindo a procissão. Aquele asfalto da rua São Bento que ainda sente
diariamente o peso dos pneus dos veículos sobre si, recebia há 32 anos os
passos de centenas de participantes da festa de Pentecostes. Havia certa luz
divina resplandecente no olhar e semblante de cada festeiro e das pessoas, como
o casal Lourdes e Newton, que não consigo descrever em palavras. É um
sentimento que permanece nestes mais de trinta anos sem perder a unção da fé
manifestada.
Volto à história do doutor Newton Vieira de Souza. A Rua
São Bento no começo do século 19 foi um dos locais em evidência de Sorocaba.
Era lá que as monjas beneditinas de Santa Clara moravam e tinham a sua
congregação. Newton era filho de pais cartorários em Ribeirão Preto, cidade que
nasceu em 08 de junho de 1909. Seus pais Jarbas Viera de Souza e Abigail Vieira
de Souza construíram uma linda história de vida com os serviços prestados à
comunidade ribeirão-pretana. O Coronel Jarbas como era chamado, foi até
prefeito na cidade. Com 18 anos de idade, o filho Newton Vieira de Souza
decidiu estudar medicina no Rio de Janeiro. Focado nos estudos e na cultura,
era um frequentador assíduo de concertos musicais da cidade maravilhosa. Depois
de formado em Oftalmo-Otorrino , conquistou pela sua competência, uma carta de
apresentação para ser entregue ao doutor Stilitano na Santa Casa de Sorocaba.
Não vacilou. Pegou o trem e chegou por
aqui nas terras sorocabanas com a carta nas mãos esperançosas. Aquele
jovem médico, determinado e com confiança na sua capacidade profissional foi falar com o diretor responsável clinico
doutor Stilitano. Após ler a carta referenciada do professor da faculdade do
Rio de Janeiro, tomou a decisão de contratá-lo, sem antes, no entanto, passar o
jovem candidato Newton Vieira por momentos de incertezas sobre a sua
contratação . A notícia do emprego chegaria dias depois, com o acréscimo de receber uma casa alugada para ele morar em Sorocaba.
Nascia ali uma amizade duradoura e irmanada do Stilitano e Newton, unindo as
famílias de ambos. Nas andanças pelo
centro de Sorocaba aos finais de semana, já que morava na rua São Bento 295, o
jovem médico recém chegado Newton Vieira
de Souza saia andar na praça central, onde naquela época as moças circulavam ao
lado da Igreja Matriz. Em uma dessas ocasiões, conheceu a jovem Lourdes Rios. O
olhar apaixonado e a “química” do amor os uniu no namoro, noivado e casamento
em 14 de abril de 1937. Um dos padrinhos
registrados na certidão do cartório foi o amigo Stilitano e esposa. Com os
filhos chegando, primeiro a Abigail, depois a Maria Cecilia, Lourdes Bernadete
e o caçula Jarbas Vieira de Souza, a necessidade de uma casa grande os levou a
morar na rua Monsenhor João Soares. A história da família nesse casarão foi
recheada com as delícias da professora Lourdes, uma mãe com aptidões culinárias
espanholas e italianas de seus pais. Na mesa reunida em família, os quatro
filhos e a lembrança do prato ”Puchero”, preparado com muito tempero do amor
materno, faz o filho Jarbas se emocionar no relato, em relembrar a alegria e o paladar
da comida da mamãe e a convivência amorosa com os irmãos e pais.
O médico Newton Vieira de Souza exerceu a medicina com
dedicação plena aos seus pacientes.
Assumiu como diretor sanitarista o Centro de Saúde de Sorocaba e pode
realizar o seu trabalho em prol da população. Sua missão maior era a prática da
medicina ao povo conforme relembro alguns dos comentários que ouvia em casa dos
meus pais. Sem jamais perder o seu jeito de nobreza no uso do terno alinhado,
gravata e a sua bengala, o doutor Newton
fez a diferença na vida de milhares de
pessoas. O profissional humano ao extremo nas suas atitudes cristãs foi
exemplar na Santa Casa de Sorocaba, onde na década de 50 atendeu uma emergência
no hospital e me salvou de morrer sufocado quando engoli a maior moeda do
dinheiro da época e fiquei engasgado. Lembro-me do fato e, jamais imaginaria
que um dia iria escrever um artigo para homenageá-lo exatamente 110 anos após o
seu nascimento. Recentemente fui ao consultório do seu filho, também médico na
mesma especialidade, Francisco Jarbas Vieira de Souza e manifestei a minha
gratidão eterna por seu pai ter salvado a minha vida nesse engasgo de criança e
acabei por conhecer um pouco mais da sua história.
Ele foi presidente do Gabinete de Leitura, clube que
acolhia as personagens da cultura da terra de Baltazar Fernandes. Doutor Newton
com um grupo de médicos fundou há 48 anos a Unimed Sorocaba. Ajudou os prefeitos
da cidade nas décadas de 50 e 60 e deixou como cidadão e medico desinteressado
em levar vantagens para si, um trabalho voltado à população carente para uma
gestão voltada à saúde dos pobres. Sua esposa, Lourdes Rios Vieira de Souza sempre esteve ao
seu lado até o dia 22 de novembro de 2002, quando faleceu, ajudando-o a conduzir as suas atividades com
determinação. Cuidava dos quatro filhos e mantinha na sua devoção fiel a NS da
Ponte, ela a mãe de Jesus, o porto
seguro da mãe protetora no seu lar.
Ao entrar na sala do filho Jarbas volto meus olhos para o
alto e vejo no quadro da parede a imagem de seu pai com a mesma elegância, olhar sereno e de ternura como se
estivesse ” a cobrar” a continuidade de
sua obra naqueles que ali buscam atendimento humano à saúde. E do seu lado, a
foto da sua mãe no dia da sua formatura como professora, completa o carinho e
respeito dessa família, que tem, além do Francisco, mais três irmãs e os netos.
E como sempre, fui muito bem atendido pela secretária
Maria de Lourdes Ponce Tavares, que há 16 anos trabalha no consultório e que
merece ser lembrada aqui por sua generosidade e competência.
Vanderlei Testa
Jornalista e Publicitário
@artigosdovanderleitesta
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